Quando minha irmã morou em Teresópolis uns anos atrás, a coisa que eu mais lembro era de passar o fim de semana toda empanturrada.
Os cafés da manhã eram fartos, lindos e cheirosos. Comíamos com a mesma satisfação de quem come café da manhã de hotel. Uma alegria! Depois, ainda tirando a mesa do café já começava a função do almoço. Era um acontecimento a família toda reunida para cozinhar. Tinha música, cervejinha gelada, amendoim, gargalhada. Depois do almoço uma soneca na rede, uma biribinha, uma pausa daquelas incríveis que os finais de semana nos permitem sem culpa. O fim da tarde vinha chegando e com ele, claro, a hora do café. Um bolinho, um biscoitinho, uma torradinha talvez. Eu nem tinha digerido o almoço direito e já tava me enchendo de pão com geléia.
Durante o café da tarde se discutia qual seria o lanche: wafflles, pizza ou uma sopinha mais leve? Mesmo que fosse a sopinha, ela não vinha sem pães de queijo, pastinhas, broas e croissants. Era uma orgia gastronômica.
Lembrei disso essa semana porque nos últimos meses eu tenho me sentido assim empanturrada. Não de comida. Mas de vida.
São tantas vivências, notícias, preocupações que a impressão que me dá é que num dia de 24 horas eu nunca consigo digerir nem metade das coisas que coloquei para dentro. Tipo aquela sensação de quem acabou de sair de uma churrascaria.
Drummond já dizia que “a vida necessita de pausas”. Mas com a vida apressada que a gente tem levado quem tem tempo para dar um tempo? Ninguém.
E aí vem a sensação de empanzinamento. Caramba. Até a palavra é indigesta.
Não sei se você se sente assim, leitor. Mas de uns tempos para cá, eu venho desejando um sal de fruta mágico para dar conta da vida pós-pandemia. A gente coloca coisas demais para dentro e não tem nenhuma estrutura emocional para dar conta de absorver tanta coisa.
Minha terapeuta costumava dizer que as vivências precisam de tempo para ser integradas. Qualquer que seja a experiência, a gente não consegue assimilar nada de uma hora para outra. E mesmo as noites, que dividem os dias, não são tempo suficiente para nenhuma digestão. Claro né. Com a cabeça cheia, quem consegue ter uma noite restauradora de sono? Ninguém.
Outro dia uma amiga tentou salvar um passarinho-bebê de ser atropelado. Parou o trânsito, fez mil manobras numa rua super agitada, mobilizou toda sua energia para no final, ter que assistir uma pessoa louca de pressa, furar todos os bloqueios e esmigalhar o pobre bichinho bem na sua frente. Ela ficou destruída. Estragada para o resto do dia, que estava apenas começando. Uma vivência assim, como tantas outras que a gente tem vivido, precisa de um tempo para assentar na alma.
Eu ando suspirando muito. Acho que é essa tentativa de colocar a alma no lugar. Trazer ar para um corpo que anda sufocado. Um corpo que anda amedrontado que falte ar. Que falte sorte. Que falte leito. Que falte vacina. Que falte compaixão. Que falte vergonha na cara desses governantes. Que falte dinheiro. Que falte esperança. Que falte, sobretudo, força e coragem para a gente enfrentar tudo que precisa enfrentar, todos os dias, quando abre os olhos de manhã.
Alguém aí conhece uma solução para isso? Algum Sonrisal milagroso que ajude o corpo e a alma a dar conta de tanto sapo engolido? Sapo, tristeza e dureza?
Aguardo dicas! Inté!