Manoel de Barros

Resolvi estudar Manoel de Barros.

Como quem escolhe uma universidade e faz o ENEM para BioMedicina ou Letras, resolvi pegar uma antologia do Manoel de Barros e estudar suas poesias como quem estuda a anatomia de uma alma.

Manoel se chamava de “serzinho mal resolvido, igual filhote de gafanhoto”. Venho sentindo que para estudá-lo é preciso bem mais do que um lápis e um dicionário. É preciso bem mais do que cultura e domínio da língua. Para estudar Manoel é preciso ter muito perto do coração, a criança que fomos um dia.

É preciso ser simples e ter a coragem de olhar o avesso. O inverso. O contrário.

É preciso ler frase a frase, fechar os olhos e repetir as palavras ao vento só para ver onde elas nos levam.

Nada é óbvio na poesia dele. Apesar da simplicidade. Nada é rebuscado. Apesar das palavras difíceis. Nada é o que parece ser. Apesar da transparência. E o melhor: não há nele uma nesguinha de metidez. Em sua obra mora um ingenuidade que dá na gente vontade de chorar.

Passo o tempo todo comigo mesma brincando de formar imagem com as poesias que ele cria. E acho que era isso mesmo que ele queria. Que a gente lesse e estranhasse. Só para ter o prazer de dar risada da gente.

Sinto Manoel assim: rindo de mim lá do outro lado do rio. Muito danado.

Eu acho que eu to apaixonada.

E me apaixono mais e mais a cada página estudada.

O segredo para ler Manoel de Barros está na subjetividade e na verdade da alma de cada um. E é isso que me fascina. Se a gente não souber criancês, não vai conseguir nunca acessar o menino das formigas, das árvores, do sol e do rio.

Esse menino também sou eu.

Eu que fui menina do mato, dos girinos, das joaninhas, das amoras selvagens, das chuvinhas tristes de Teresópolis.

O menino me atravessa.

E foi assim me atravessando, que eu descobri que somos feitos do mesmo barro, da mesma matéria. Crianças sempre em busca daquele lugar perdido onde se faz transfusão de natureza e onde tudo faz sentido.

Se eu quero virar PhD em Manoel de Barros? Quero não.

Mas quero que ele venha me buscar quando eu morrer. Nem que seja como gafanhoto.

O que achou?